São Paulo, uma das maiores cidades do mundo, vista de uma floresta próxima
Parece incrível que mais de 80 anos após as implicações da física quântica terem quebrado o pensamento clássico, muitos ainda consideram o universo de objetos e pessoas como um sistema estático e linear, feito de pequenos blocos discretos que podem ser observados e, portanto, controlados de uma forma perfeitamente previsível . A falha básica deste velho paradigma está em imaginar que por compreender as coisas que podemos impor a ordem sobre elas. O menor tremor da terra desmonta essa ilusão.
Este tipo de antropocentrismo é uma
das principais razões por nosso afastamento da natureza como ela realmente é – vibrante,
comovente, viva e interativa, desintegrando-se e organizando-se continuamente.
O divórcio entre a natureza interna do ser humano e a Natureza física,
consideravelmente reforçado ao longo dos últimos 300 anos, quase conseguiu
destruir o nosso planeta – quase, mas não completamente.
Uma tarde numa praia deserta. Um pôr
do sol visto de uma montanha majestosa. Uma caminhada numa floresta virgem.
Quem não sente uma identificação com a beleza dos elementos da natureza? A
dicotomia do morador dos grandes centros urbanos, é que o fim de semana termina
e as férias o arremessam de volta ao seu posto de trabalho de onde fica
contemplando esta 'natureza' que só existe longe dos barulhos e cheiros dos
centros urbanos. Muitos permanecem apenas no nível deste sonho tão bem
representado pela letra da música de Elís Regina - "Eu quero uma casa no
campo, Onde eu possa ficar no tamanho da paz..." Pelo menos contam os dias até a próxima
oportunidade surge para 'voltar' para a natureza.
A natureza é vista de forma
romântica como uma utopia que contrasta com a distopia das manchas urbanas e
seu materialismo frenético. A busca do "selvagem nobre" de Rousseau
que vive harmoniosamente com a natureza e livre de egoísmo inspira o
fundamentalista ambiental até hoje.
Do outro lado, a visão
antropocêntrica e infelizmente vigente, é que o homem, sendo a peça principal
da criação, tem o direito de explorar ad infinitum, os recursos da natureza,
que lhe foram predestinados por algum decreto divino. Porém, não podemos negar
que as outras espécies têm seu lugar. Há mais micróbios em um centímetro cúbico
de terra que houve de seres humanos em todo a sua história!
Só recentemente, começamos a
questionar estas duas posições extremas para encontrar um ponto de equilíbrio
entre a sustentabilidade eo desenvolvimento, que até agora têm vivido em
contradição uma com a outras. Empresários, políticos, cientistas, ONGs e
cidadãos comuns "tentam" fazer uma ponte entre a preservação da
beleza inerente do nosso planeta e o uso racional de seus recursos. Mas, como
algun filósofo moderno disse:
"tentar, muitas vezes é uma forma preguiçosa de não fazer nada".
A principal dificuldade é que a
dialética de ambos os extremos de nossas obrigações sobre a natureza está equivocada. Não é o homem contra a Natureza ou
que ele estava sempre brigando com ela e agora tem que se vestir de uma outra
mentalidade para 'salvá-la'. Nossos corpos são feitos dos mesmos elementos que
formam a Natureza. É o ar, a água e o alimento que nos fornecem cada molécula.
As cidades são a Natureza transformada - as pedras que se tornam cimento, as
árvores que se convertem em vigas, as antigas florestas que acabaram em petróleo
e mais tarde em plástico. Portanto, a Natureza não é algo que começa onde as
cidades terminam.
Vale a pena, neste momento, refletir
sobre as implicações da física quântica na nossa visão do mundo. Há mais de 80
anos, ela abandou a divisão entre o observador (tipicamente um ser humano) e o
observado (tipicamente a matéria inanimada). Os dois formam um todo. Um
influencia o outro. Evidentemente, isso não se refere apenas à matéria, mas o
que fazemos com ela e uns com os outros na construção de uma sociedade.
Enquanto continuamos a enxergar
natureza como algo separada, um sujeito passivo como um paciente inconsciente
numa mesa de operação, não vamos entender a profundidade da kinterrelação e da
interdependência entre nós e nosso planeta que é um casamento de longa data. A
dança entre o observador e o observado, implica que os problemas externos na
natureza e na sociedade são manifestações da contaminação e da confusão que
reinam dentro de nós. São inseparáveis.
E a propósito, quantos dias faltam
até voltar para aquela praia?
Do livro, O Espírito do Líder, Integrare Editora, São Paulo, 2008
Por Ken O'Donnell